Igreja Católica Reúne Forças para Entrar no Século 21

João Paulo II já declarou 2000 Ano Santo e pretende mostrar, mais uma vez, o poder e a magnificência de seu império aos olhos do mundo, embora o número de católicos venha diminuindo significativamente

PETER WENSIERSKI, do Der Spiegel

Duas vezes por semana, aos domingos e nas quartas-feiras, o sumo pontífice da Igreja Católica recebe em grande audiência. O ritual respeita sempre o mesmo esquema: o papa aparece na loggia da Catedral de São Pedro, na janela de seu palácio, ou circula com o "papamóvel", cumprimentando a multidão em diversas línguas, antes de abençoá-la. A atmosfera reinante na praça às vezes se assemelha à de um estádio de futebol superlotado, antes do gol da vitória. Os fiéis do mundo inteiro agitam bandeiras e cartazes, berrando a plenos pulmões: "Viva il papa!"

Duas vezes por semana o mundo católico parece estar em ordem: às vezes 5 mil, outras vezes 50 mil e até mesmo 100 mil pessoas entoam loas ao chefe supremo de um império que abrange perto de 1 bilhão de almas. Porém, as aparências enganam. Em seu comportamento cotidiano, os homens e as mulheres que acenam para o idoso João Paulo II pouco se diferenciam daqueles que contemplam o papa romano como se fosse um ser exótico, vindo de um outro mundo.

O código moral dos católicos há muito já se adaptou ao da sociedade secularizada. Eles praticam o sexo como os infiéis e se divorciam, quando bem entendem, pouco se importando com os vereditos do papa.

Até mesmo na matriz do Vaticano, na Itália, menos da metade dos habitantes acredita numa vida após a morte ou que a Igreja Católica é a única religião. Sem se deixar impressionar, o Vaticano continua exibindo sua força, como se o mundo que o cerca ainda refletisse a promessa do Reino de Deus.

No limiar do novo milênio, a pompa deverá ser potencializada: João Paulo II declarou 2000 Ano Santo, no qual mais uma vez o poder e a magnificência do império católico tornará a refulgir aos olhos do mundo.

No Natal de 1999, o papa baterá seu martelo dourado na normalmente fechada Santa Porta da Catedral de São Pedro, disparando um mecanismo que abrirá aos peregrinos a pesada porta lateral, proclamando o Ano Santo, tal como ocorre em espaços de 25 anos. O papa quer deixar sua marca nas comemorações do milênio: 20 milhões de visitantes estão sendo aguardados em Roma, durante o grande jubileu.

Velho caminho - Depois de Berlim, a Cidade Eterna tornou-se o maior canteiro de obras da Europa: novas linhas de metrô, gigantescas garagens, novas vias e igrejas renovadas. Há meses, a de São Pedro está envolta em andaimes.

O ano jubilar de 2000 não deverá ser comemorado apenas em Roma, como também ao redor de todo globo católico. Na oportunidade, o octogenário papa iniciará sua "grande viagem a caminho do povo de Deus do Velho Testamento": do Egito através do Sinai, de Jerusalém até Damasco, para encontros com judeus e muçulmanos.

Algumas "atrações" de gosto duvidoso também ressurgirão dos depósitos, entre elas o Santo Sudário, de Turim, e outras relíquias destinadas a atrair os curiosos. Uma "prévia" realizada na Catedral de Turim na primavera deste ano levou 2, 5 milhões de peregrinos a apreciar a suposta face de Jesus impressa no pano.

Com essa feira de amostras milenares, o papa deseja, antes de mais nada, documentar as reivindicações de poder de sua Igreja como guardiã da única verdade redentora e instância-mor da moralidade no mundo.

Última monarquia - Mas o consórcio internacional rende tributo a verdades medievais, sujeitando-se a uma direção centralista antiquada: esse é o mal de que padece. Os conflitos internos deverão crescer mais do que a acumulação universal das almas. A reforma da Igreja, iniciada por João XXIII no Segundo Concílio (1962 a 1965), foi retida por seu sucessor polonês.

Em vez de abrir-se à emancipação do ser humano e à conseqüente democratização das próprias estruturas, a Igreja Católica ingressará no terceiro milênio como a última monarquia absolutista destacada. E, neste fim do segundo milênio, sua influência política sobre as nações industrializadas ocidentais se tornou menor do que nunca, a despeito da encenação das manifestações de júbilo e da incansável diplomacia de viagem do "padre apressado", uma alcunha irônica usada até mesmo por católicos praticantes.

Fonte: Arquivo digital do jornal O Estado de S. Paulo


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