Polêmica Sobre Música:
8 Histórias Verídicas de "Zelo Sem Entendimento"

Francisco Gonçalves

Como prometi a princípio, apresento-lhes esta matéria sobre o tema em lide, com a ressalva de que não me considero músico. Sou vocacionado para o ministério, para o qual Deus me chamou desde minha infância, e, por Sua graça, concedeu-me também o dom da música, a qual não estudei formalmente. Participei da gravação de alguns discos, desde 1966. Fui membro do Arautos em 1979/1980 e do Quarteto Reencontro, formado por ex-membros do Arautos. Compus alguns hinos, ainda hoje cantados aqui e ali. Fiz algumas versões, e só. Portanto, não falo como músico e, sim, como um ex-pastor a quem Deus emprestou esse talento, o qual busco usar para Sua exclusiva honra e glória.

"Assim diz o Senhor: Maldito o homem que confia no homem, que faz da carne seu braço..." Jeremias 17:5.  "De modo que cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus." Romanos 14:12

Pessoas têm advogado que NÓS podemos dizer quem é isso ou aquilo, e exprobar outros em nome de Deus. Quem se insere nesse NÓS?  Por favor, excluam-me! pois não me julgo digno e à altura de tão dura responsabilidade. Menciono alguns fatos - VERÍDICOS - nos quais pessoas - inclusive pastores, por que não?! - julgaram estar cumprindo a vontade de Deus e estavam equivocados, SINCERAMENTE equivocados, "têm zelo de Deus, mas não com entendimento" (Rom. 10:2).

1. 1962, Del Delker vem ao Brasil e, num oportuno furo jornalístico, a CPB publica uma foto sua na capa da Revista Adventista. Choveram cartas e críticas porque ela estava com o cabelo bem curto, quase estilo 'joãozinho'. Ora, isso hoje não causa espanto algum, nossas irmãs (e irmãos) cortam e pintam os cabelos à vontade.

2. 1972 - IAE-SP - Uma secretária de educação vai ao Colégio para uma inspeção de rotina, e é impedida de entrar por estar de calça comprida. Ofereceram-lhe uma saia para pôr por cima, ela recusou, logicamente! Hoje é uma indumentária absolutamente corriqueira.

3. 1972 - IAE-SP - o Coral Carlos Gomes preparava a cantata "Do Olivete ao Calvário", na qual eu era solista barítono, para apresentar na Semana Santa, numa série de conferências do pastor Campolongo, num domingo. 

Na sexta feira pela manhã, o maestro Flávio Garcia me chama a sua sala no Conservatório e me comunica que o Conselho da Faculdade de Teologia havia decidido, sem me consultar, que eu não poderia me ausentar do internato naquele domingo porque haveria um jantar de confraternização com as moças da Enfermagem, e eu deveria tocar para o Eliseu Leal, que fora convidado pra fazer um programa de música e anedotas. 

O maestro discordava da posição adotada, mas já estava ensaiando com outro solista substituto. Revoltado, decidi não comparecer ao jantar, já que não fora ao menos consultado e não podia fazer aquilo para o que me havia preparado. O Eliseu, ao saber disso, também não participou...

4. 1972 - IAE-SP - Um jovem teologando industriário namorava uma garota que trabalhava na cozinha, como ele. À noite, após o trabalho, ele a levava até à porta do dormitório feminino e dava-lhe um rápido beijinho de boa noite. 

Numa noite, o vigia noturno viu a cena, falou com alguém, que relatou ao pastor da igreja, que reuniu apressadamente a comissão que, sem antes ouvir os 'acusados', votou aplicar-lhes uma disciplina de 6 meses. Sábado, após o culto, visitantes instados a se retirarem, o secretário da comissão apresenta o voto para que a assembléia o sancione. 

O jovem estava na congregação e a moça trabalhando na cozinha, ouvindo pelo sistema de som. Que susto, coitados!

O professor Jerome Justsen levanta-se contra, insistindo que caberia, no máximo, uma disciplina acadêmica e não eclesiástica. Resultado: a assembléia se recusou a votar, o assunto voltou à comissão, quando então se constatou que ambos não poderiam ser disciplinados, pois sua carta de transferência não havia sido recebida pela igreja do Colégio!

5. 1978 - IAE-SP - Num sermão sobre música, um famoso pastor, hoje líder mundial, manipulou grosseiramente texto da Sra. White, fazendo-a dizer o que efetivamente não pretendeu, afirmando que ela era contra a dissonância na música sacra, quando, na verdade, ela não emitiu conceitos técnicos. Apenas comparou a música que, em visão, ouvira nos céus, com a música que na época era cantada na igreja! (Confira em Testemunhos Seletos, vol. 1, pg. 45, parágrafos 1 e 2).

"...Depois que saí da visão, o canto aqui me soou áspero e dissonante..."  

Por favor, não dá para violentar uma idéia assim, para alicerçar uma tese, por mais bem intencionada que seja, sem que a mesma caia em descrédito, por absoluta fraude intelectual.

Nesse mesmo sermão, o pregador foi agressivo, grosseiro e mal-educado, ao brandir uma coletânea jovem recém lançada, "Vamos Cantar" e vociferar: "Isto aqui é música de baixa categoria, composta por gente de baixa categoria, para ser cantada por gente de baixa categoria!"  E pensar que o responsável pela elaboração daquela coletânea, o jovem músico Williams Costa Júnior, hoje pastor, estava sentado na primeira fileira, tendo que engolir tanto vomitório!

6. 1978 - Itaipava-SP - Encontro de Músicos e Compositores Brasileiros. Aquele sermão foi repetido ali, por solicitação dos organizadores, mas uma das grandes bobagens ditas por um pastor-pretenso-músico-e-maestro, foi que "temos mais de 900 mil hinos para serem traduzidos, não precisamos de novas composições ". 

Disse isso, por certo,  porque Deus não lhe deu o dom de compor, mas perdeu a oportunidade de ficar calado, pois se sua tese se confirmasse também não precisaríamos que o Espírito Santo inspirasse novos sermões, bastaria pregar os milhares existentes! Como também perderíamos belas mensagens que Deus inspirou a nossos compositores, hinos encontrados no Hinário Adventista e em CDs gravados por intérpretes que se deixam usar por Ele.

Nesse Encontro, movido pelo Espírito Santo, Mário Jorge tomou a palavra e, após várias considerações sobre as afirmações ouvidas, desafiou os palestrantes a julgarem se uma de suas composições, feita em parceria com Alexandre Reichert, era de inspiração divina ou não. Se eles concluíssem que não provinha de Deus, ele jamais voltaria a compor. 

Cantou o hino, houve sinceras lágrimas e pedidos de perdão da parte de alguns palestrantes. Outros, além de não chorarem, endureceram-se mais. E graças a Deus aí estão as composições do Mário Jorge, e de tantos outros compositores, que nos levam para mais perto dEle.

7. Mais recentemente - IAE-SP - Flávio Santos e um obreiro over-sea são obrigados a tirar a barba, sob pena de demissão/retorno. O professor-missionário explicou que não fazia a barba por questões de saúde, sua pele ficava toda empolada, mas não houve jeito. Ambos atenderam à ordem, só que o americano ficou com o rosto empolado e vermelho. Então, o Colégio decidiu deixá-lo ficar com a barba! Mas o Flávio raspou-a...

8. Recentemente, IAE (C1 ou C2...) - Um pastor-professor e um aluno de Teologia discutem asperamente em sala de aula. 

Dia seguinte, o professor, que sempre dava aulas de guarda-pó, aparece em sala de terno e com o guarda-pó no braço. Dirige-se ao aluno, dizendo: "Vim de terno, porque quero falar como pastor agora. Nós tivemos uma discussão acalorada, mas como cristão e como pastor desejo pedir-lhe perdão". Logicamente, houve emoção entre os alunos, abraços foram trocados. O professor, depois, tirou o paletó, vestiu o guarda-pó e, dirigindo-se novamente ao aluno, disse-lhe:

-- Bem, como pastor eu perdoei a você, mas como professor, você está reprovado em minha matéria. Queira retirar-se da sala, por favor!

Como afirmei em minha primeira participação neste site, o tema música é apaixonante, e jamais se chegará a uma unanimidade, na igreja ou fora dela. Por exemplo, um 'sábio', 'entendedor' de música, afirmou: "Se o Sr. Villa Lobos ama a música, afaste-se dela" (imaginem!). 

Citações do livro O Ouvido Pensante, de Murray Schaffer: 

"Quem dá a você o direito de distinguir entre música e não-música para as outras pessoas?"

"... o que quer que a música seja, está claro que não pode depender do gosto de uma só pessoa."

Os fatos narrados comprovam que não dá para submeter ao critério de outrem nossa própria consciência ou nossos gostos pessoais, porque o ser humano é falível e limitado. Parafraseando Romanos 14:13-23:

"Portanto, não nos julguemos mais uns aos outros. Antes, seja o vosso propósito não pôr tropeço ou escândalo ao irmão. Eu sei, e estou certo no Senhor Jesus, que nenhuma coisa (música) é de si mesma imunda. Mas se alguém a tem por imunda, então para esse é imunda. Se por causa da música se contrista teu irmão, já não andas conforme o amor. Não faças perecer por causa da tua música aquele por quem Cristo morreu... Tens tu fé? Tem-na em ti mesmo diante de Deus. Bem-aventurado aquele que não se condena naquilo que aprova..."

Todo este capítulo fala de moderação, de respeito às opiniões e gostos alheios, plenamente aplicáveis a qualquer tema alvo de controvérsias que não envolvam princípios, mas costumes, gostos, que diferem de pessoa para pessoa, de lugar para lugar, de tempo para tempo. 

Em se tratando de música, que envolve subjetividade, sentimentos, emoções, criatividade, é comum, é natural, é humano, é normal confundir-se princípio com gosto pessoal. Por exemplo: alguns acham que o estilo ideal de música para nossa igreja é o "Hei de Estar na Alvorada", cuja linguagem não atinge minimamente aos jovens! Quem se atreverá a determinar o que ou quem é ou não é inspirado por Deus? Quem se arrogará o dom profético de julgar os motivos, de ler os corações, de conhecer as intenções? Eu não me atrevo!

Aceitar as diferenças de opinião, respeitar divergências, também isso constitui a essência do Cristianismo. -- Francisco Gonçalves

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